sexta-feira, 22 de abril de 2011

o jogo do zodíaco (resenha)





Os grandes filmes demoram a ser descobertos. Zodíaco (2007) passou despercebido pelos cinemas, pelos festivais, pelos camelôs, pelo Pirate Bay e por todas as outras redes oficiais e clandestinas de exibição. Talvez, com o passar dos anos, o filme de David Fincher comece a conseguir parte de todo o reconhecimento que um dia vai merecer.



Os filmes de "caça ao serial killer" sempre foram tidos como um gênero menor, como filmes "B". Raramente mereceram por parte do público uma atenção que fosse além da sala de projeção. Basicamente, os espectadores esperavam por sustos e pela surpreendente revelação do final. E quanto a isso eles não podem reclamar, pois o cinema americano traz todos os anos inúmeros exemplares do gênero. Agora, um exemplar do gênero como Zodíaco é raro, se não único.




Em 1968, jornais de São Francisco, CA, começam a receber mensagens cifradas de alguém que diz ser o responsável por uma série de assassinatos acontecidas em cidades próximas. O suposto assassino, que se identifica pelo nome de Zodíaco, ameaça dar sequência aos crimes caso os jornais não publiquem as mensagens.




No filme dirigido por David Fincher (Seven, Clube da Luta) acompanhamos os jornalistas do São Francisco Chronicle, Robert Graysmith (Jake Gillenhaal) e Paul Avery (Robert Downey Jr), e os policiais David Toschi (Mark Ruffalo) e William Armstrong (Anthony Edwards) nas investigações para tentar chegar à pessoa que se esconde por trás do codinome Zodíaco.




Fincher sempre se destacou pelo primoroso trabalho técnico. Porém, nesse filme ele superou as expectativas. Desde a primeira tomada exibindo a noite de São Francisco iluminada pelos fogos de artifício é impossível não dizer que poucos trabalhos de fotografia no cinema conseguiram captar de forma tão esplendorosa um cenário urbano. Juntamente com a fotografia de Harris Savides, os trabalho de direção de arte e de figurino conseguem ir além das monótonas reconstituições de época. A sensação ao assistir a Zodíaco é de estar vendo um filme que foi rodado na década de 60 com a tecnologia do século XXI.




Impressiona a facilidade com que o filma transita por vários gêneros, passando do terror para a comédia e da comédia para o drama de forma bastante convincente. Aliás, grande parte da força do filme se deve a alternância de situações dramáticas e cômicas, onde o diretor consegue construir um jogo de contrastes que causa surpresa e nervosismo no público. Difícil não ficar aflito com a cena que mostra um casal de namorados sendo atacado de forma tão violenta na beira de um lago em uma bela tarde de primavera. É como colocar um filme de terror dentro de uma comédia romântica.




Apesar de as sequências de assassinato estarem presentes e serem muito bem construídas, elas são secundárias no filme. O que interessa ao diretor é explorar a obsessão dos personagens para descobrir quem é o Zodíaco. Esse enfoque revela uma evolução do cinema de Fincher se comparado ao seu primeiro filme policial. Em Seven as angústias dos personagens ficavam em segundo plano com relação ao jogo sádico do assassino, em Zodíaco o jogo é figurativo e os personagens são a essência.



O que contribui para essa escolha do diretor é o excelente trabalho do elenco. Principalmente de Robert Downey Jr, que interpreta o jornalista Paul Avery com total naturalidade, mostrando que atuar vai muito além de usar o verbo e as lágrimas.



Outro destaque é o roteiro escrito por James Vanderbilt. Ele consegue registrar de forma muito precisa todos os detalhes que envolveram o caso: o nome das pessoas, dos lugares, a coleta de evidências e a consulta de datas e documentos. Graças à mágica da edição, usada com a sabedoria de quem entende que não apenas as palavras dialogam, mas as imagens também, torna-se um prazer acompanhar um filme que durante os seus mais de 150 minutos nunca se torna confuso ou cansativo.



Zodíaco mantém o foco no processo de apuração e principalmente nas dificuldades que atrapalham ou que muitas vezes inviabilizam esse processo. Entre as quais a vaidade, que acaba colocando jornalistas e policiais em campos opostos, terminando por comprometer a investigação. O filme também ressalta de forma muito perspicaz as dificuldades de se trabalhar em conjunto numa época em que computador era artigo militar.



Ao abordar o trabalho de duas profissões que lidam com a "verdade" e que buscam obsessivamente encontrar respostas, Zodíaco parece afirmar que todas as vezes que o ego fica acima do compromisso e a tecnologia abaixo do esperado a única certeza que resta é a da dúvida.

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